PASSAPORTE || Midnight Sun


O Midnight Sun — ou Sol da Meia Noite — é resultado do solstício de verão, quando o Sol incide com maior intensidade no hemisfério norte, onde se encontra o Círculo Polar Árctico — no qual Tromsø faz parte —. O solstício é o fenómeno que marca as duas estações do ano mais extremas — inverno e verão — e que está ligado às temperaturas e à duração dos dias ou noites. E é neste último que os fenómenos mais incríveis acontecem. No caso do Sol da Meia Noite, o nome não dá margem para erros: o Sol incide com tamanha intensidade que não existe noite. O hemisfério norte nunca deixa de estar iluminado.

E quando não existe noite, não existe mesmo noite; o Sol põe-se — na altura da minha visita, às 00H00 — estagna numa determinada linha do horizonte e volta a nascer, do mesmo lado — às 01H00 em Junho —. O céu não escurece, não vemos a Lua e, se tiverem sorte, poderão observar um delicado tom rosa ao amanhecer — que não se vão dar conta se não estiverem atentos às horas —. O contrário também se verifica — no solstício de Inverno — onde os dias são feitos praticamente de noites, razão pela qual Tromsø é o destino recomendado para assistir a auroras boreais: com um período alargado de escuridão e boa visibilidade no céu nocturno, o fenómeno ocorre praticamente todos os dias e pode ser observado da cidade (embora existam dezenas de centros turísticos para marcarem tours especializadas em auroras boreais). Uma vez que visitámos Tromsø no verão, a presença ininterrupta de luz impede-nos de observar qualquer tipo de fenómeno no céu — e é por isso que as auroras são fenómenos de época baixa —. Não ficámos tristes. O Midnight Sun pode ser igualmente fascinante.
Em Oslo, este fenómeno não acontece, porém, o anoitecer acontece muito tarde — por volta das 23H00 — e às 03H00 já há luz da manhã. A noite nunca é muito escura, mas existe!

Nunca sofri muito com jet lag. Nada de muito relevante. E por isso nunca pensei que a ausência de noite fosse afectar-me tanto. Fui apanhada em falso. Este fenómeno lindíssimo cansou-me muito mais do que qualquer diferença horária e fez-me concluir algo que, se nunca tivesse experimentado o Sol da Meia Noite, jamais desconfiaria: a importância da sentirmos o dia a fechar.

O nosso metabolismo desacelera na mesma velocidade dos nossos dias. Quando começa a anoitecer, começamos a sossegar, a acalmar, a preparar o nosso corpo para uma noite de sono. Mas não temos noção disto até presenciarmos a ausência da noite. Não ter escuridão — nem um pequeno vislumbre dela — fez-me sentir que os dias não encerravam e que estava a viver um dia extremamente longo para o qual fazia sestas ocasionais. Os meus sonos não eram profundos por saber que era dia e assumir que ainda tinha 'muito para tratar'. Perdi a noção dos dias da semana e esquecia-me da hora de jantar. Lanchava infinitamente sem me dar conta que a minha fome era para jantar, para fazer uma refeição de mesa.

Alguns dos meus conselhos principais para desfrutarem bem deste fenómeno são, tirando o dia em que evidentemente vão querer explorar uma cidade às três da manhã com uma luz estrondosa — como não o fazerem?? — obrigarem-se a desacelerar, optarem por programas mais dinâmicos durante as horas típicas de dia e escolherem espaços mais fechados nas horas da noite. Façam questão de levar convosco uma máscara para dormir. Um dos meus maiores erros foi assumir que os hotéis e apartamentos estavam preparados para estes fenómenos e tinham um bom isolamento das janelas. Não caiam na mesma ilusão. Nenhum dos locais onde ficámos tinha estores, apenas cortinas que deixavam a luz escapar de lado. Se precisarem de escuridão total para dormir, as máscaras são essenciais.


Depois deste meu relato, talvez o Sol da Meia Noite já não vos pareça tão encantador. É o preço a pagar pelo retorno fascinante; sempre que penso em Tromsø, vem-me à cabeça o tom amarelo. Não só do meu casaco — parceiro de aventuras nesta viagem — mas também pela luz dourada com que fomos agraciados na nossa chegada. O Sol amarelado dava à cidade uma luz única, alegre e dourada que era quase palpável e mágica. Assistir ao pôr e nascer do Sol sentada no porto enquanto conversava sobre assuntos aleatórios foi um dos momentos mais bonitos que já vivi na minha vida. Só havia silêncio, luz dourada, as nossas vozes e o som das ondas do mar. Passear pela madrugada fora na cidade luminosa, ver todos os recantos sem obstruções, encontrões ou pessoas a passar foi absolutamente terapêutico. E toda a experiência de explorar um lugar onde a escuridão não existia valeu cada olheira — vocês já sabem o quanto eu gosto de experiências em primeira mão —.

Tenho a sorte de viver num país onde o dia divide cordialmente tempo de antena com a noite. Já tive o privilégio de ver o Sol nascer no horizonte do mar, numa praia paradisíaca. E agora tive a oportunidade de viver dias sem fim. Eu sempre preferi o dia à noite. O nascer ao pôr. Mas ali eu aprendi a fazer as pazes com a noite e a amar ainda mais um manto escuro cheio de estrelas. Quando fecho os olhos e penso em Tromsø, lembro-me imediatamente daquela luz dourada única que me iluminava as sardas, da brisa fresca e do cheiro a mar.

8 comentários

  1. Gosto da maneira como abordas os teus post's! Tens imenso jeito.
    Achei interessante, mas acho que iria ter o mesmo stress, quando é para dormir gosto de escuro 😊
    Mas é sempre interessante conhecer e ver coisas novas 😊

    ResponderEliminar
  2. Deve ser mágico! Era um sítio que adorava visitar um dia e ver aurora boreais.

    ResponderEliminar
  3. Vi os teus instastories a falar sobre o Sol da Meia Noite e fiquei fascinada, comecei logo a chatear todos aqui em casa para juntarmos Tromsø à lista de lugares a visitar!
    https://opequenogirassol.blogspot.com/

    ResponderEliminar
  4. Adorei ler! Que relato fantástico. Só pelo que li, já tive sensações de ter estado em tal local.

    Fiquei a desejar visitar Tromsø aquando das auroras boreais... Não sei porquê! :) Vou fazer planos para isso.

    Obrigada! ❤

    ResponderEliminar
  5. Deve ser um fenómeno fantástico, mas fico igualmente fascinada com a possibilidade de assistir a auroras boreais.

    ResponderEliminar
  6. Não sei se gosto mais do teu relato em si pelo conteúdo ou pela forma como o escreves :) gostava imenso de viver esse fenómeno - e mais ainda de ver a aurora - e não duvido que passaria pelo mesmo cansaço que tu. Precisamos da noite para saber aproveitar o dia...seja na realidade ou como metáfora :)

    Jiji

    ResponderEliminar
  7. Ainda há pouco tempo comentei este fenómeno com familiares. É estranho e pergunto-me como viverão as pessoas desses lugares, com dias sem noites e noites sem dias... É certo que já estão habituadas, mas acho que o organismo nunca deixa de se ressentir... Realmente, quando pensamos nisso, vemos a importância da noite, de haver diferença entre noite e dia... Acho que, se também passasse pelo sol da meia-noite, teria os mesmos stresses que tu, principalmente à desorientação em termos de horas e no que toca a adormecer, pois preciso de escuridão quase total para isso xP Mas não deixa de ser fascinante e deve ser bonito de se viver :)
    Também sinto curiosidade em relação ao fenómeno oposto: o ser sempre noite :P
    Gostei muito deste teu relato :)

    ResponderEliminar
  8. Simplesmente encantador! Cada vez mais me surpreendo e ainda bem :)
    Mal posso esperar por, um dia, nos próximos anos, poder dizer: Nice to meet you, Noruega :) Tu, com o Bobby Pins, inspiras-me tanto a conhecer lugares novos, por mais próximos que me possam ser. Um simples café/restaurante novo ao virar da esquina (como as boas notícias;) )!
    Um grande beijinho 😘❤

    ResponderEliminar

Partilha comigo o teu comentário ou opinião sobre este artigo. Sempre que possível, respondo às perguntas diretamente no comentário. Obrigada por estares aqui :)

Desde 2014

Instagram


P.S: HÁ SEMPRE BOAS NOTÍCIAS AO VIRAR DA ESQUINA
_______________________
Bobby Pins. Theme by STS.